Café com fubá: combinação que celebra o Brasil
Quem nunca teve a experiência de se sentar à mesa com a família num domingo de tarde e tomar um café passadinho (como diriam nossas avós) acompanhado de um bolo quente ou uma broa de fubá… ah, se você nunca viveu isso você precisa experimentar. Café com fubá é mais que combinação, é tradição brasileira raiz.
Grão marronzinho e grão dourado, que juntos andam muito bem acompanhados, vai ser a dupla destaque dessa nossa prosa de hoje. As tradições caipiras que envolvem o fubá, esse ingrediente que nasce do milho e carrega tanta história e tradição, assim como o café.
Ingredientes tão brasileiros quanto eu e você, fazendo as honras hoje aqui no PDG Brasil. Vem com a gente conhecer três receitas e histórias da chef Heloísa Bacellar, da empresária Paola Morales e do barista Diogo Moreira (ZUD Café) e da consultora Alda Barroso, com uma pitada de afeto e prosa.
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Grãos irmãos
Você sabia que dia 24 de maio é o dia nacional do milho e também do café? Esses dois ingredientes tão brasileiros dividem o mesmo dia comemorativo. Coincidência ou não, os caminhos do café com fubá se cruzam na cultura e na cozinha brasileira.
Segundo a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), o café é a segunda bebida mais consumida do mundo, perdendo apenas para a água. O Brasil é o líder global em volume de produção, tendo Minas Gerais como o maior estado produtor.
Sob a mesma análise, o milho é o cereal mais consumido do mundo, com o Brasil sendo o terceiro maior país produtor e o segundo maior exportador, e tendo Mato Grosso como o maior estado produtor.
O nome milho significa “o sustento da vida”. E para nós, está associado à tradição caipira, onde se desdobra em muitas possibilidades de ingredientes de base para receitas culinárias: temos o fubá, que é a farinha fina do milho maduro moído, base de bolos doces, salgados e o angu; já a farinha em flocos é base do cuscuz, do virado e da farofa; o tão importante e versátil amido, conhecido como maisena, base de deliciosos sequilhos. Sem falar das espigas de milho verde que podem ser cozidas ou assadas na brasa, e até a sua palha que enrola a pamonha e o fumo de corda. Na versão mais seca do grão inteiro temos a tão amada pipoca, e também a base alimentar para animais como porcos e galinhas, comumente encontrados nos quintais caipiras brasileiros.
O caipira e o café com fubá
Antes de cozinhar, de colocar a panela no fogo, é interessante entender a comida como uma expressão cultural e ultrapassar a simples necessidade fisiológica, englobando costumes e comportamentos.
Nossa alimentação tem uma função estruturante no que diz respeito à organização social de um povo, e é nesse sentido que podemos definir a questão do “ser caipira” e todas as circunstâncias de suas preferências culturais, alimentares e sociais.
O caipira é um grande observador das coisas simples e alguém conectado com os fluxos da natureza, o que o torna muito ligado à tradição e à ancestralidade. E até hoje há quem ainda não saiba dar o devido valor ao caipira, pelo fato de não conhecer de maneira real seu estilo de vida, suas lutas e história.
Essa ancestralidade nutrida pelo caipira e suas tradições desenharam muito do que vemos hoje. Por exemplo, junho é mês das festividades juninas e também o início do solstício de verão no Hemisfério Norte, onde antigamente aconteciam rituais pela fartura nas colheitas e chuvas, que associados ao cultivo das plantas nada mais era do que uma “a preparação do terreno”, o plantio e a colheita.
Com o passar do tempo e a chegada da era cristã, houve uma adaptação desses rituais para festejos associados a santos, como São João. É possível também observar nesse período a questão da sociabilidade entre as populações rurais, outro ponto a se considerar.
70% da população brasileira até meados do século XX vivia no campo. Famílias integradas a seus grupos familiares e também à instituição do compadrio (compadre, comadre, padrinho, madrinha, serviam de estreitamento do convívio) e do trabalho em mutirão.
Esses aspectos somados a religiosidade da cultura caipira ressaltam a existência das festividades juninas, onde as famílias se misturavam e comemoravam o início ou fim de um ciclo agrícola, ou o padroeiro do lugar.
Festividades que até hoje reforçam as tradições caipiras e a cultura gastronômica de quitutes à base de milho, receitas que passam de geração em geração e não podem faltar à mesa acompanhadas de café coado e um “dedin” de prosa. Ô combinação boa que é o café com fubá!
Broa de fubá com doce de leite do ZUD Café. Crédito: ZUD Café.
O fubá que constrói memórias e inspira
“O primeiro doce de fubá que comi foi um mingau que a mãe de uma vizinha minha fazia com leite e leite condensado, era maravilhoso”, conta Paola Morales, sócia administradora da cafeteria paulistana ZUD Café.
Apesar de nascida em Santiago do Chile, Paola foi criada em Foz do Iguaçu, no interior do Paraná. Ela comenta sobre como é comum por lá o bolo caseiro e receitas com esse viés. Conta que toda família tem sua receita, e o fubá é a estrela de muitas delas: com goiabada, com leite de coco e coco ralado.
“Fubá tem total relação afetiva. Só de sentir o cheirinho no ar dá vontade de tomar café”, comenta e recorda que esse ingrediente sempre esteve presente na vida dos brasileiros, casas e lembranças de infância.
Lá no ZUD o barista Diego Moreira se inspirou nessas memórias e desenvolveu uma receita de broa de milho recheada com goiabada ou com doce de leite que faz o maior sucesso. E eles contam que estão desenvolvendo mais receitas com fubá para breve, haja inspiração para combinar café com fubá.
BROA DE MILHO COM DOCE DE LEITE
- 250 g de farinha de trigo
- 250 g de fubá mimoso
- 250 g de açúcar
- 1/2 xícara de leite integral
- 100 g de manteiga
- 15 g de fermento químico em pó
- 4 g de sal
- 3 g de erva-doce
- 1 lata de doce de leite (350 g em média)
PREPARO:
- Em uma vasilha coloque todos os ingredientes secos, misture bem e reserve.
- Em seguida, coloque a metade do leite e a manteiga e derreta bem (na panela, ou microondas). Adicione a essa mistura os ingredientes secos, e mexa até formar uma massa. Se necessário, vá acrescentando mais leite morno para dar ponto. Lembre-se de sovar bem.
- Deixe descansar por 30 minutos, depois porcione em bolinhas de aproximadamente 70 g e adicione uma medida de 15 g de doce de leite no meio da massa.
- Posicione as broas na assadeira com espaços de 4cm entre elas. Leve ao forno preaquecido à temperatura média de 180oC por 15 minutos.
Bolo de fubá da Vó Betty. Crédito: Ana Bacellar.
Só fubá e amor de vó
Entre as receitas favoritas (desde criança) da chef Heloisa Bacellar, e também uma das mais compartilhadas durante sua vida, está esse bolo de fubá de sua querida avó Betty. “O bolo é tudo de bom e mais um pouco, ainda mais com uma canequinha de café ao lado!”, só para reforçar essa dupla maravilhosa que é o café com fubá.
Ele é amarelíssimo, ultramacio e úmido. Dica de ouro para o preparo: “com os fubás precozidos que hoje aparecem em muitos supermercados, a receita funciona bem, mas o tempo no fogo é bem menor comparado a um fubá artesanal. Assim que a mistura ferve, ela já engrossa e pronto (se continuar cozinhando por mais tempo, como com o fubá comum, a massa vira quase uma bola e as claras em neve não são suficientes pra dar leveza ao bolo, que fica bom gosto bom, mas textura de polenta).”
Por isso o segredo de sua avó é revelado: cozinhar a massa como se fosse um angu antes de misturar as gemas, o fermento e as claras em neve e depois assar.
Esse bolo simples já é um sucesso, mas você pode misturar 200 g de goiabada firme cortada em cubinhos e transformar a receita em “bolo de fubá com goiabada”, ou também bananada: “costumo alternar camadas de massa com rodelas de banana polvilhadas com canela e açúcar.”
BOLO DE FUBÁ DA VÓ BETTY
- 2 xícaras (chá) de fubá (300 g)
- 2 xícaras (chá) de leite (480 ml)
- 2 xícaras (chá) de açúcar (300 g)
- 1/3 de xícara (chá) de óleo vegetal (80 ml)
- 50 g de manteiga
- 1 colher (chá) de sal
- 4 ovos, gemas e claras separadas
- 1 colher (sopa) de fermento químico em pó
- Manteiga pra untar
- Fubá pra polvilhar
PREPARO
- Aqueça o fubá, o leite, o açúcar, o óleo, a manteiga e o sal numa panela média e, sempre mexendo com uma espátula, deixe no fogo por uns 10 minutos, até a massa ferver e engrossar e o fundo da panela aparecer (se usar fubá pré-cozido, o tempo diminui muito, pois ele engrossa assim que a mistura ferve e está pronto). Deixe amornar por uns 10 minutos.
- Aqueça o forno a 200ºC (médio-alto). Unte com manteiga e polvilhe com fubá 1 fôrma para grande para pudim, ou 1 uma assadeira grande.
- Bata as claras em neve até conseguir picos firmes. Coloque os cubinhos de goiabada numa tigela, polvilhe com fubá e junte à massa. Junte também as gemas, o fermento e, em seguida, com uma espátula e muita delicadeza, incorpore as claras. Se quiser, nesse momento, junte os cubinhos de goiabada ou de bananada. Despeje a massa na fôrma e asse o bolo por uns 40 minutos, até que esteja crescido, bem dourado e firme (ao enfiar um palito no centro, ele deverá sair limpo).
- Deixe esfriar e desenforme sobre um prato raso. Se quiser, polvilhe o bolo com um pouquinho de açúcar.
Quadradinho de fubá cremoso. Crédito: Alda Barroso.
A cara e o gosto da tradição mineira
Nem só de café vive um barista. E, para provar que isso é realmente verdade, a barista, mentora e consultora em negócios de café Alda Barroso traz para a gente uma receita que por onde passou foi só elogios: a broa de fubá cremosa. “Me recordo dos comentários dizendo que lembra o café da fazenda feito pela nossa avó.”
“Sou muito atenta e tocada por receitas que resgatam boas lembranças e que contam um pouco de história do que há nas casas e nos ‘causos’ de Minas Gerais.”
Em seu trabalho como autônoma em Belo Horizonte e interior de Minas, conta que já trabalhou em mais de 40 cafeterias, onde foi acumulando muitas histórias. “Esta receita do bolo de fubá foi pensada com carinho para fazer parte do cardápio como uma forma de valorizar as tradições mineiras, de receitas adquiridas com o tempo, que resgatam histórias, tem essência e lembranças particulares. Na época do lançamento no Boutique Café, cafeteria onde dei consultoria, ela fazia tanto sucesso que disponibilizávamos cópias para os clientes, todo mundo queria a receita.”
Impossível resistir a essa mistura de café com fubá. Então, tome nota:
QUADRADINHO DE FUBÁ CREMOSO
- 4 ovos
- 4 xícaras de leite
- 100 g de coco ralado
- 100 g de queijo minas ralado
- ½ xícara de amido de milho
- 1 xícara de fubá (de preferência o mimoso, mais fininho na moagem)
- 1 e ½ xícaras de açúcar
- 2 colheres (sopa) de manteiga
- 1 colher de fermento em pó
PREPARO
- Coloque todos os ingredientes no liquidificador (comece sempre pelos mais líquidos) exceto o fermento que irá somente no final. E bata até a mistura se tornar homogênea. Depois coloque a mistura em uma assadeira untada e polvilhada com fubá. Às vezes a gente duvida que vá virar bolo, pois a massa fica muito líquida. Porém, acredite, é assim mesmo, e fica delicioso o resultado.
- Leve a assadeira ao forno preaquecido à temperatura média de 180oC, por 40 a 45 minutos, e faça o famoso teste do palito.
- Sirva em pequenos pedaços quadrados acompanhados de café coado na hora.
Fica, vai ter café com bolo
Não há dúvidas de que o milho, bem como o café, tem papel fundamental na cultura e na história dos brasileiros. Em seus vários formatos, está presente em nossas mesas há séculos e seguem marcando os sabores das nossas vidas até hoje.
Agora não tem mais desculpa para não manter viva essa tradição do café com fubá. Com essas receitas maravilhosas, você está apto a continuar essa tradição caipira.
E, mais do que isso, é preciso respeitar as raízes que construíram essa jornada e se mantêm vivas até hoje graças ao povo caipira. Respeito com os ingredientes em todos os processos dessa cadeia do plantar, colher, secar, moer, igual acontece com o café especial que a gente tanto ama e dá valor.
Crédito foto de destaque: Ana Bacellar.
PDG Brasil
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