Infusão e aromatização no processamento de cafés
Agora mais do que nunca, há um número aparentemente infinito de maneiras de processar café. Da fermentação anaeróbica à maceração carbônica, esses métodos de processamento experimental ajudam a melhorar o sabor do café – e até criar novos. Infusão e aromatização também fazem parte dessa conversa.
Essas técnicas envolvem a introdução proposital de outros ingredientes durante o processamento para criar novas camadas de sabor e aroma. E para saber como essas elas se encaixam hoje no setor de cafés especiais, é importante saber diferenciá-las.
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O que é a aromatização?
Pode ser difícil definir exatamente o que são cafés infundidos e aromatizados. Não há termos formais da indústria para esses cafés, portanto, as definições se resumem principalmente a opiniões individuais.
Nanelle Newbom é a representante de vendas na Equal Exchange. Ela também é uma torrefadora e compradora de café verde na Torque Coffees. Ela explica como define a infusão ou a adição de aromas. “É quando você adiciona outros ingredientes separados ao café verde ou torrado para criar um novo sabor.”
“Na minha opinião, alterar o sabor de um café adicionando cepas de levedura ou controlando os níveis de oxigênio durante o processamento não altera completamente o sabor do café. No entanto, acho que adicionar certos ingredientes ao tanque de fermentação durante o processamento resulta em um café aromatizado”, acrescenta.
Outro ponto importante que Nanelle levanta é se os ingredientes adicionados são naturais ou artificiais. “Para muitos profissionais do café, a diferença entre adicionar ingredientes naturais e artificiais é uma relativa. A resposta nem sempre é tão clara porque o que definimos como um café com sabor pode diferir muito, não necessariamente torna uma opinião conflitante incorreta”, explica.
Comparando com a infusão no processamento
Saša Šestić é o fundador e diretor da ONA Coffee and Project Origin. Ele também é o Campeão Mundial de Baristas de 2015 e especialista em técnicas de processamento de fermentação – particularmente maceração carbônica. Em 2021, Saša escreveu dois artigos para o PDG: um sobre problemas com a infusão no processamento de cafés e outro respondendo a perguntas comuns sobre a infusão no processamento .
Saša explica sua definição a infusão no processamento de cafés. “É a adição de ingredientes e aromas específicos. Podem ser óleos essenciais, especiarias, ácidos, ervas, frutas, vegetais ou qualquer outro ingrediente. Devemos ser capazes de detectar a presença desses ingredientes ou aromas na bebida final”.
“A infusão pode acontecer durante a fermentação, quando o café está secando em pátios, durante o armazenamento ou em barris”, acrescenta. “O café pode ser infundido quando está verde, ou após a torrefação, ou mesmo quando o café é moído.”
Nanelle, por sua vez, acredita considera a infusão apenas quando se adiciona ingredientes ou aromas durante o processamento.
E quanto ao café envelhecido em barril?
O envelhecimento dentro de barris que foram usados para fabricar bebidas como uísque, vinho, rum e outras bebidas alcoólicas é outra forma de aromatizar cafés. Steven Restrepo, chefe de café do Café de Colita, explica que a intenção é que o café absorva alguns sabores do barril.
Como o café verde é altamente suscetível a uma série de condições ambientais, a madeira do barril influenciará os sabores do café. Normalmente, essa prática resulta em notas de sabor frutadas, fermentadas e mais “excêntricas”. Essas notas geralmente remetem ao produto anteriormente acondicionado no barril.
“Eu torrei alguns lotes de café envelhecido em barril há alguns anos. As pessoas estavam realmente interessadas nisso, e vendeu muito bem, tanto em embalagens para varejo como na xícara. Pessoalmente, prefiro cheirar este café a beber, mas certamente gerou muito interesse”, diz Nanelle.
Quais as diferenças entre a infusão e a aromatização no processamento de cafés?
As definições de cafés aromatizados e infundidos dependem muito da opinião dos profissionais do café. Por sua vez, obter uma compreensão clara das principais diferenças entre os dois é difícil.
“Os cafés aromatizados são aqueles que foram processados usando fermentação e adição de leveduras e bactérias, bem como adicionando sabores artificiais”, diz Steven.
Enquanto Saša acredita que a infusão pode acontecer em qualquer estágio, Steven pensa o oposto. “Os cafés infundidos são aqueles entram em contato com sabores artificiais após a torrefação”, explica.
Nanelle, enquanto isso, fornece outra perspectiva. “Há muitos cafés que incluem suplementos adicionados como CBD ou colágeno, por exemplo. Mas se eles são infundidos após a torrefação para evitar desnaturar ou destruir o suplemento adicional não se sabe ao certo”.
No entanto, ela explica ainda que a linha entre infusão e aromatização do café pode ser turva. “Por exemplo, você pode adicionar levedura usada de cerveja no tanque de fermentação. Isso eu considero como controle do processo de fermentação, mas não infusão no café. Mas adicionar lúpulo durante o processamento, aí sim seria uma infusão”, diz.
“As pessoas também podem adicionar frutas diferentes, o que confunde ainda mais a linha”, acrescenta. “A fruta é fermentável e produz diferentes açúcares dos quais as cepas de levedura se alimentam, mas a fruta também transmite seus próprios sabores, então eu diria que resulta em cafés infundidos.”
É claro que há muitos desafios quando se trata de definir a diferença entre cafés infundidos e aromatizados. No entanto, Saša espera que isso mude no futuro. “Antecipo que, à medida que aprendemos mais sobre as complexidades dos cafés infundidos e aromatizados, as definições mudarão e evoluirão”, diz.
Qual a relevância para o setor de cafés especiais?
Há certamente um argumento de que os a infusão e a aromatização podem causar uma série de problemas, especialmente a falta de transparência.
“Qualquer sabor ou infusão adicionado quando o café chega ao seu destino de exportação tira valor dos produtores. Em vez disso, agrega valor para os torrefadores.”, diz Nanelle.
Steven, por sua vez, afirma que os cafés infundidos e aromatizados permitem que produtores, comerciantes e torrefadores ofereçam um novo tipo de produto. “Nossos clientes pedem produtos personalizados e exclusivos, então por que não apoiar os agricultores para conseguir isso? Enquanto houver demanda por esses tipos de café, vamos criá-los.”
Como é o mercado para cafés que passaram por infusão e aromatização?
Embora as opiniões e preferências sobre a infusão e aromatização de cafés estejam divididas entre os profissionais da indústria, Steven diz haver claramente um mercado para esses grãos. “Tudo começou quando nossos clientes na China nos pediram para procurar cafés com infusão de uísque, então há uma tendência aí”, afirma.
Após o sucesso inicial, Steven explica que experimentou adicionar ingredientes diferentes. “Usamos maçã, laranja, morango, chocolate, chiclete e limão. Mas nossos cafés infundidos e aromatizados mais vendidos são maracujá e canela”, acrescenta.
Além desses cafés, Steven acredita haver uma demanda significativa por técnicas estendidas de processamento de fermentação. “Métodos de processamento de fermentação prolongados, controlados ou mais recentes são o nova tendência. A demanda é alta e continua a aumentar. Principalmente na China, Coreia do Sul, Japão e Arábia Saudita.”
Nanelle concorda, dizendo que a demanda de torrefadores e consumidores está crescendo. “Alguns desses cafés são mais direcionados para o cliente final, enquanto outros são voltados para torrefadores. Todos querem impulsionar a inovação e se diferenciar. Isso coloca os produtores em uma posição forte para comercializar novos produtos a um preço mais alto também”, acrescenta.
Transparência é a chave
Muitos profissionais do café concordam que, para obter o máximo valor desses cafés, é preciso haver total transparência sobre como se dão os processos de aromatização e infusão. “Por exemplo, se um torrador usa aditivos, é preciso haver uma comunicação aberta sobre isso para que nenhum valor seja retirado dos produtores”, explica Nanelle.
Steven concorda, dizendo: “Na minha experiência, algumas pessoas não são transparentes o suficiente sobre seus cafés com adição de sabores ou infusão. Estamos abertos a compartilhar nossas técnicas, porque leva anos para aprender a executá-las com sucesso. E ainda mais para dominá-las.”
No entanto, ele enfatiza que a transparência completa sobre os processos de aromatização e infusão seria benéfica para o setor. “As pessoas que não entendem completamente o trabalho que envolve esses procedimentos. Mas é um trabalho de amor – você não pode criar esses cafés apenas para ganhar dinheiro”, conclui Steven.
Embora a indústria cafeeira certamente possa se beneficiar de delinear uma definição clara para cafés “infundidos” e “aromatizados”, também é evidente que precisamos entender mais sobre ambos para avaliar seu futuro no setor cafeeiro.
“Estabelecer padrões claros da indústria é útil, de modo a não difamar ou desvalorizar esses cafés”, conclui Nanelle. “Além disso, podemos aumentar a conscientização das pessoas sobre os cafés que estão comprando, vendendo e consumindo.”
Gostou? Em seguida, leia nosso artigo sobre como responder a algumas perguntas comuns sobre cafés infundidos.
Créditos das fotos: Steven Restrepo
PDG Brasil
Traduzido por Daniela Melfi
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